SAÚDE
Médicos buscam novas formas de atuação fora do consultório

Pesquisa mostra que 18% dos profissionais da saúde já atuam em outras áreas além da clínica
Durante décadas, o caminho da carreira médica seguiu um roteiro quase inalterado: vestibular concorrido, faculdade integral, residência, plantões e consultório próprio. Mas esse modelo começa a ser questionado por uma nova geração de profissionais que, mesmo formados, não se sentem plenamente realizados no exercício da medicina tradicional.
No lugar da previsibilidade, surgem trajetórias que combinam saúde com tecnologia, gestão, empreendedorismo e educação financeira. E, cada vez mais, o “médico fora do consultório” deixa de ser exceção.
Jonathan Sarraf, 32 anos, é um desses nomes que fazem parte dessa transição. Formado em Medicina, deixou os plantões há quatro anos. “Demorei para admitir que a rotina que eu tinha já não fazia mais sentido. Mas o incômodo foi crescendo, até que eu percebi que era possível cuidar das pessoas por outros caminhos”, afirma.
Hoje, ele se dedica à gestão de negócios voltados para médicos. Uma atuação que nasceu da escuta das dores e desafios que outros colegas enfrentavam no dia a dia. “Muitos médicos estavam sobrecarregados com tarefas administrativas, com finanças mal organizadas, sem tempo para descansar ou investir no próprio crescimento. E, ao mesmo tempo, estavam criando conteúdo, fazendo pós-graduações, empreendendo, se posicionando nas redes. Ou seja, continuavam médicos, mas também buscavam se expandir como profissionais e como pessoas. Foi aí que percebi que eu podia contribuir com isso também”, explica.
Embora a decisão de abandonar o jaleco ainda gere estranhamento em alguns círculos, o movimento é crescente. Segundo a pesquisa Demografia Médica no Brasil 2023, realizada pela Associação Médica Brasileira (AMB) em parceria com a Faculdade de Medicina da USP, 18% dos médicos atuam em mais de uma ocupação além da clínica, incluindo ensino, gestão, tecnologia e empreendedorismo.
O número tende a crescer com a chegada de profissionais mais jovens ao mercado, que já entram na profissão com novos valores e expectativas em relação à carreira e à vida pessoal.
Para Sarraf, o modelo tradicional está em transformação: “O médico de hoje quer trabalhar, mas também quer tempo, liberdade e coerência com os próprios valores. E nem sempre isso cabe no sistema como ele está posto. E isso não significa rejeitar a medicina, muito pelo contrário. É entender que ela pode ser vivida de formas diferentes, mais alinhadas com quem se é”, diz ele, ressaltando que participa de grupos de liderança, empreende no setor e compartilha sua experiência em podcasts e palestras.
A medicina, ele acredita, está longe de perder valor. “Ela continua sendo uma das profissões mais nobres e necessárias que existem. Mas não precisa ser vivida como um fardo. É possível honrar a formação e, ainda assim, traçar um caminho único. Hoje, eu continuo ajudando médicos. Só troquei o lugar de onde faço isso.”